Quantas vezes você já se deparou com alguma reportagem ou publicação com a seguinte manchete: “Conheça as 10 profissões do futuro” ou “20 profissões que serão extintas nos próximos 20 anos”? Mas será que realmente é possível fazer esse tipo de previsão? Será que algumas atividades ocupacionais vão, de fato, desaparecer? 

Nesse artigo vamos responder – ou pelo menos tentar – responder a estas perguntas. 

A tecnologia vai substituir os trabalhadores? 

Faxineiros, taxistas, assistentes jurídicos, contadores, auxiliares de escritório e motoristas de caminhão. Em uma rápida pesquisa no Google, essas são algumas das profissões apontadas com previsão de acabarem nos próximos anos. 

Uma pesquisa da MGI¹ sobre o potencial de automatização da economia global analisou mais de 2.000 atividades laborais e a viabilidade de automatizar cada uma delas. O resultado? Menos de 5% das profissões podem ser totalmente automatizadas e causa a substituição total de trabalhadores. 

Apesar disso, é muito comum encontrar pessoas que reafirmam a teoria de que a inteligência artificial modificará totalmente o mundo como conhecemos nas próximas décadas, em especial profissionalmente. Por isso, separamos alguns motivos pelos quais isso é bem improvável de acontecer – em especial, nas próximas décadas. 

Acesso à tecnologia 

Uma pesquisa do Instituto Locomotiva² revelou que, no Brasil, cerca de 33,9 milhões de pessoas não têm acesso à internet e quase 90 milhões não conseguem se conectar todos os dias. No mundo, são mais de 4 bilhões de indivíduos desconectados – sendo que 75% deles estão concentrados em apenas 20 países. 

Além disso, considerando um panorama mundial, um relatório produzido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em parceria com outras organizações mundiais revelou que, atualmente, aproximadamente 733 milhões de pessoas não possuem acesso à energia elétrica. A previsão é de que, até 2030, esse número seja de 670 milhões – 8% da população mundial. 

Com a pandemia, por exemplo, tudo isso ficou ainda mais nítido. No caso dos estudantes que precisavam assistir às aulas de forma online, em certas regiões do país, muitos deles precisavam se deslocar por quilômetros para conseguir acessar um ponto com internet – isso quando possuíam algum dispositivo para acessá-la. 

Portanto, é muito difícil falar sobre a tecnologia tomar conta quando ainda existem tantas pessoas e regiões que ainda não possuem acesso a ela por questões econômicas, sociais e geográficas, em todo o mundo. 

Mudança estrutural 

Precisamos também reforçar que, em alguns casos, para que um funcionário seja totalmente substituído pela tecnologia, seria necessária uma mudança muito maior e mais estruturada. 

Tomando como exemplo a profissão de contador. A legislação tributária do nosso país é extremamente complexa, portanto, pode ser difícil desenvolver um software que atenda todas as necessidades de uma empresa e esteja adequada ao seu respectivo nicho, sem contar os “jeitinhos” e “atalhos” que não são mapeáveis.

Aqui não estamos falando de ilegalidade, mas sim de caminhos ilógicos que somente a mente humana consegue descobrir e guardar, o famoso “pulo do gato”. 

Isso sem contar toda a burocracia envolvida. Idas ao cartório, autenticação e análise de documentos que ainda não podem ser trocadas por um robô, justamente porque envolvem uma questão relacionada à legislação do país. Seria necessária uma mudança nas leis e, principalmente, uma simplificação que as tornassem mais lógicas para que o trabalho pudesse ser totalmente automatizado. 

Seguindo nesta linha, temos a KOY — Inteligência Jurídica³, uma startup de Recife que utiliza a IBMWatson Knowledge Studio e linguagem natural para analisar processos em segundos, gerando insights sobre os aspectos financeiros que apoiam a tomada de decisão, decisão esta que necessita de uma análise humana.

Com o apoio dessa tecnologia as empresas conseguem antecipar bloqueios judiciais, localizar ativos judiciais, encerramentos com classificações por motivos e gerar agendamentos inteligentes de providências a serem tomadas, dando visão de gestão 360º. A solução ajuda a economizar tempo e dinheiro, apontando valores a serem descontingenciados para levantar o caixa da empresa.  

Segundo Dante Araujo, Diretor Jurídico da IBM Brasil³: “A incorporação do uso da tecnologia na rotina do profissional do direito é essencial para que ele também consiga lidar com a quantidade exponencial de dados a que está exposto, aumentando sua capacidade de resolver problemas complexos e gerar valor para seus clientes e suas organizações.

O emprego adequado da inteligência artificial estimula o potencial humano e tem sido um dos pilares fundamentais da transformação digital que estamos vivendo, e o mundo jurídico também faz parte desta transformação”. 

Com estes exemplos podemos perceber o quanto a tecnologia, se bem aplicada e distribuída de forma acessível, pode ser uma aliada, facilitando alguns processos, trazendo benefícios financeiros e permitindo que os seres humanos se dediquem a atividades mais nobres e estratégicas, portanto, sem substituí-los – pelo menos não ainda.

Assim, acaba sendo mais uma questão aproveitamento da tecnologia como ferramenta para aumentar sua produtividade, da mesma forma que um marceneiro utilizar um martelo e nós, meros mortais, não vivemos mais ser fritadeiras elétricas. 

Inovação e novas possibilidades 

Em 2011, a McKinsey Paris realizou um estudo⁴ na França e constatou que, apesar de ter acabado com cerca de 500 mil empregos, a internet proporcionou o surgimento de outros 1,2 milhões! Além disso, uma pesquisa também da McKinsey aponta que, apenas nos Estados Unidos, vão faltar 250 mil cientistas de dados no país em uma década. 

Esses dados revelam que, apesar de a tecnologia realmente ser capaz de substituir alguns trabalhadores, ela também tem o poder de trazer novas possibilidades para os profissionais.  

Há alguns anos, era inimaginável que as redes sociais teriam um papel tão importante para a comunicação, ainda mais para as empresas, como uma ferramenta de publicidade. Hoje, existem até pessoas que são especialistas em apenas uma plataforma, como os profissionais que trabalham apenas com o Instagram ou o Twitter. 

E ainda existe a possibilidade de ressignificar e inovar a sua própria área de atuação. Quando serviços como a Uber, Lift e 99 surgiram, disseram que seria o fim dos taxistas. Mas não foi bem isso que aconteceu. 

Muitos motoristas acabaram migrando para esses aplicativos e suas variações, e ainda assim, outros mantiveram-se no modelo tradicional onde continuam atuando até hoje, talvez com algumas pequenas adaptações.  

Alguns se mudaram para cidades menores que não estão na área de atuação dos apps, outros passaram a focar totalmente em um público mais velho e que não é muito fã de tecnologia. Isso sem contar aqueles que também passaram a oferecer água, balinhas etc., tentando competir diretamente com o serviço tecnológico e por fim, melhorando a experiência de seus clientes. 

Ou seja, esses motoristas buscaram se inovar na área, mudaram a estratégia ou o público-alvo e lutaram para manter se manter na ativa.  

Então não devo me preocupar? 

Na verdade, todos precisamos ficar atentos às novas tendências que vêm surgindo diariamente com a tecnologia. Esse é um dos pilares da inovação: entender as mudanças e como podemos reinventar nossa realidade com base nelas. 

E muitas coisas vão mudar nos próximos anos, como sempre foi, só que num ritmo ainda mais acelerado. E é necessário, para quem deseja se manter no topo do mercado, se adaptar e evoluir com elas. Mas num mundo tão fluído, nada é garantido. 

Há alguns anos, as pessoas davam o vinil como ultrapassado. Agora, é considerado um item vintage, voltou ao gosto popular e muitas pessoas voltaram a consumir música nesse formato. Quando a televisão surgiu, disseram que o rádio estava morto. Quando a Netflix surgiu, há mais de uma década, ela supostamente destruiria a televisão de vez.  

Portanto, fazer previsões é difícil. Afinal, ainda estamos falando de um planeta dominado por pessoas. Existe ser mais imprevisível do que elas? 

 

¹Pesquisa MGI

²Pesquisa Instituto Locomotiva

³Startup de Inteligência Jurídica

⁴Relatório McKinsey Paris, 2011

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